
Mas ele veio, cortando o meu rosto como agulhadas a medida que eu andava na rua. Não andei mais que 10 minutos na rua, mas pareceu uma travessia por um deserto gelado. No ambiente de trabalho, esqueci-me da temperatura que estava na rua, ainda na esperança do vento cessar, da chuva parar assim como aconteceu nos dias anteriores.
Quando saí do trabalho notei quão despreparada para a chuva eu estava. Sem guarda chuva nem agasalho suficiente, tomei chuva, vento gelado até eu chegar em casa e colocar uma roupa bem quentinha. Coloquei uma roupa de forma que eu não passasse mais frio nessa tarde, e saí pra resolver mil coisas que ainda precisavam ser feitas nessa sexta-feira de inverno.
E já era noite, quando um homem na rua me parou, pedindo esmola e falou o seguinte:
"Compra um leite pra mim moça, eu não vou conseguir me sentir quente como você deve estar se sentindo. Eu só tenho isso"
Aí eu olhei para o moletom surrado dele. Olhei para as chinelas havaianas dele no chão gelado e molhado de chuva. Olhei para as mãos sujas dele em direção às minhas;
Olhei para mim, minhas botas, meu cachecol, meu sobretudo, minha meia quente.
Lembrei da tarde em que passei frio, tomei chuva e molhei meus pés. Eu fiquei com frio, com raiva do frio e das minhas condições de trasnsporte. Mas só até o tempo de eu chegar em casa e tomar meu banho quentinho pra colocar a meia, o casaco, o cachecol. E quanto a ele? O homem com as mãos sujas apontando para mim? E os pés dele? Devem estar congelando.
Nem todos vão acabar seu dia em um lindo edredon onde o vento não alcança. Inverno é gostoso pra quem pode ficar vendo pela tv quantas pessoas morrem de frio e de fome na rua.
Isso mudou a minha forma de encarar meu dia.